Tinha asas. E pensar que todos nós, caídos do céu, já tivemos asas.
Tinha asas, não como as de um pássaro precipitado ao precipício,
Resistindo ao vento, irresistível sopro.
Tinha asas, não como as de um anjo, imperfeição perfeita,
Solidão desfeita pela vida eterna.
Tinha asas, não como as que batem fortes, sustentando o corpo,
Imitando as luzes que imitam o tempo.
Tinha asas, não como voluntário apêndice, fantasia crédula,
Poder infinito sob olhar brilhante.
Tinha garras. E pensar que todos nós, única origem, já tivemos garras.
Tinha garras, não como as que sangram presas, necessária luta,
Amoral disputa pela luz do sol.
Tinha garras, não como as que prendem e soltam, liberdade efêmera,
Prisão passageira a caminho, a caminho.
Tinha garras, não como sedução desperta, sussurrar malévolo
Que provoca pânico, convulsões de amor.
Tinha garras, não como defesa lógica, atuar certeiro,
Álibi bendito a esperar momento.
Tinha sonhos. E pensar que todos nós, papéis em branco, já tivemos sonhos. Tinha sonhos, não como delírios súbitos, loucuras secretas,
Obscenas faces ocultas da vida.
Tinha sonhos, não como matéria ampla, fronteiras largas,
Caminho envolto em mantas e pedras (arredondadas).
Tinha sonhos, não despertos ao acaso, prolongada hora
De sabor ardente, de ardor urgente.
Tinha sonhos, não de indecifráveis símbolos, de irrefletida face,
Obscura fonte de mensagens certas.
Tinha asas.
Tinha garras.
Tinha sonhos.
Tinha medo.
E. J. Martins
Nov/99
É verdade?
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