Voluntário desconhecido pousa para foto em estúdio |
Por Jorge Passos
Damião;
pardo; desta Província; 20; Sr. Ramão Francisco de Lemos; data da
concessão 08-07-1867; data registro 09-07-1867 (Livro 3, p. 33r).
Descrição: A carta foi concedida “para que sirva como substituto
de meu filho João Nepuceno de Lemos, pelo tempo de 9 anos, em um dos
corpos de 1ª Linha do Exército que lhe for designado conforme é
concedido por Lei”. O referido senhor pediu a seu filho João
Nepuceno Lemos que a assinasse a rogo.
Esta é uma das Cartas de
alforria que consta dos Documentos da Escravidão, pesquisa com
Catálogo Seletivo De Cartas De Liberdade realizada no Acervo dos
Tabelionatos de municípios do interior do Rio Grande do Sul pela
APERS , na parte que se relaciona ao município de Jaguarão. Como se
vê, trata-se de concessão de liberdade ao cativo com a condição
deste, substituir o filho do Senhor como voluntário na Guerra do
Paraguai.
“La
Guerra Grande” ou “Guerra Maldita” como ficou conhecido o maior
conflito ocorrido na história da América do Sul cumpriu em 2014, 150 anos. Conforme o historiador Mário Maestri, a guerra do
Paraguai, apesar da sua importância, é semi-desconhecida no Brasil
e pouco abordada pela nossa historiografia tradicional. Em artigo
publicado recentemente, o Professor da UPF afirma que “o
conflito foi deflagrado pela invasão do Uruguai pelo Império do
Brasil, sem declaração de guerra, em outubro de 1864, para manter
direitos semi-coloniais impostos quando de invasão anterior, em
1851! Agressão exigida pelos estancieiros sulinos, general Netto à
cabeça, que mantinham a escravidão no norte do Uruguai que
dominavam, apesar de abolida naquele país em 1842-46!” .
Jaguarão foi diretamente atingida por esses acontecimentos no 27 de
janeiro de 1865, quando da invasão dos blancos à nossa
cidade, evento que nos rendeu o epíteto de heroica.
No
Brasil, depois de um inicio de entusiasmo popular, criou-se o Corpo
de Voluntários da Pátria, para canalizar o sentimento patriótico
dos que desejavam lutar pelo País. Porém, logo escassearam os
alistamentos e o recrutamento começou a ser forçado. A
substituição do recrutado ou designado para a guerra, por um
escravo, era uma das maneiras de fugir do sangrento conflito. Os
nossos antepassados jaguarenses não hesitaram em recorrer a esse
privilégio. Afinal, segundo o escritor Joaquim Manoel de Macedo,
líder da facção avançada do Partido Liberal, "os brasileiros
não se alistavam voluntariamente por acreditarem que só os pobres
lutavam".
Fazendo
justiça aos homens de Jaguarão que , provavelmente com sua morte
nos campos de batalha lutando pelo Brasil, conquistaram a liberdade,
coletei no catálogo acima citado os nomes dos escravos que publico a seguir, ressaltados em
negrito, com os respectivos senhores e ou parentes destes,
substituídos. Como gaúchos que somos e por exaltar nossas façanhas
servindo de modelo a toda Terra, nada mais justo que permitir à
comunidade negra de nossa cidade, o reconhecimento a seus
antepassados, aos que realmente foram para a frente de combate , os
nossos Voluntários da Pátria.
Faustino
José Gonçalves ; Sr. Honório José Gonçalves
Damásio
Francisco de Brum ; Sr. Manoel Francisco de Brum
Jacinto
Leodoro; Sr. Evaristo José Gonçalves, em lugar do filho
Evaristo José Gonçalves Júnior
Benedito José Nobre ; Sr.
Ismael José Nobre
Paulo Inácio Rodrigues; Sra. Justa Dias
Rodrigues, substituindo seu filho Lino Inácio Rodrigues
Tomás
de Melo em lugar de Manoel Cândido de Melo, filho do Senhor
José Maria Dias ; Sra. Maria Inácia Rodrigues Dias, em lugar
do filho Manoel Inácio Dias
Lucas Caetano dos Santos; Sr.
Manoel Corcino dos Santos
Paulo Corrêa da Silva ; Sr. João
Jacinto Corrêa da Silva
Eleutério Porto ; Sr. Joaquim
Teixeira Porto, substituindo o filho Manoel Joaquim Porto
Adão
Cunha; Sr. Basílio Evaristo, em lugar do enteado Fortunato
Antônio da Cunha
Estevão ; Sr. Tomás de Farias Santos, no
lugar do sobrinho Luís Gidião de Farias
Narciso; Sra.
Maria Dias Terra, em lugar do filho Felício Francisco Terra
Marcelino; Sra. Joaquina Maria da Conceição, em lugar de Antônio Vieira de Freitas
Manoel; Sr.
Jacinto Corrêa de Araújo
Benedito; Sr. Clarimundo Álvaro
de Melo, em lugar do filho Loregildo Pereira de Melo
Damião;
Sr. Ramão Francisco de Lemos, substituindo o filho João Nepuceno
de Lemos
Elias ;Sr. Angelino Dutra da Silveira, em lugar do
filho Leandro Dutra da Silveira
Inácio; Sr. Antônio
Joaquim Lima
[sem nome] ;Sr. Joaquim Soares de Souza.
Os
escravos quando da libertação ou alforria, geralmente adotavam o
sobrenome dos seus antigos senhores. Não adicionei à lista, os
escravos da Freguesia de São João Batista do Herval e da
Freguesia de Nossa Senhora das Graças de Arroio Grande que, à
época, pertenciam a Jaguarão. Para se ter uma ideia da importância
do escravagismo por aqui, Jaguarão em 1859 tinha 5.056 escravos,
só perdendo em número, para a capital , Porto Alegre, que dispunha
de 8.417 escravos.
Retirado de "Comprando e vendendo escravos na fronteira" de Jônatas Caratti |
CLIQUE AQUI Para consultar a íntegra da Pesquisa sobre
as Cartas de liberdade do RS
Imagens da Guerra do Paraguai
Guarda Pessoal de Caxias. Todos negros. Quem pode afirmar que não há algum
escravo liberto de Jaguarão nesta foto?
Quem era designado como voluntário e não dispunha de escravo para ir no seu lugar, ou 600 mil réis para pagar pela dispensa, vivia drama satirizado na charge abaixo. A honra e a coragem cediam lugar ao medo.
Patriotismo Escravocrata
O prejuízo dos Fazendeiros na Guerra
- Imagens colhidas no Site da Universidade Federal do Paraná- Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes- Departamento de História - História do Brasil II (HH061) Professor responsável: Luiz Geraldo Silva.
- A legislação da guerra, ainda, permitiu um a outra forma de enviar para as fileiras do Exercito escravos: o substituto. Pela lei n° 1220. de 20 de julho de 1864, ainda em vigor durante a guerra, se permitia aos recrutados e voluntários a isenção militar por substituição de indivíduos idôneos para o mesmo serviço, faculdade que igualmente foi concedida aos guardas nacionais tanto pelo artigo 126 da Lei n. 602 de 19 de setembro de 1850. como pelo Decreto n° 3513 de 12 de setembro de 1865 - OS [IN] VOLUNTÁRIOS DA PÁTRIA NA GUERRA DO PARAGUAI - dissertação de Marcelo Santos Rodrigues da UFBA.
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