A estampa era a do Amigo da Onça, a genial criação do Péricles |
Não
sei como apareceu lá em Jaguarão um fotógrafo de Pelotas a fim de
retratar os formandos da Escola Técnica de Comércio para que cada
um trocasse com os demais colegas as fotos que seriam postadas no seu
álbum de lembrança. Esse cidadão tinha uma estampa bastante
parecida com o Amigo da Onça, da revista O Cruzeiro - casaco
trespassado, ombreiras largas, abotoaduras nos pulsos da camisa,
gravatinha borboleta, calças com bainha afunilada, sapatos de verniz
de bico fino e a cara então era sem tirar nem por a mesma daquele
personagem.
Eu
não fazia parte daquela turma de formandos, pois estudava em Porto
Alegre, apesar de frequentar os encontros rubiáceos no Café do
Comércio, onde a gente ia jogar conversa fora. Eram velhos amigos,
companheiros das noitadas nas pensões da zona ou então do futebol
de salão, em que alguns costumavam atuar no campeonato local. A
gente ali na roda do cafezinho e ele, bom de papo, insinuava-se
imperceptível, contando piadas, discutindo futebol e conquistando o
pessoal com as suas refinadas maneiras; sabia vender o seu peixe como
ninguém e, quando nos dávamos conta, ele já era um dos nossos.
Um
dos companheiros, Nico, não era lá muito bem dotado de atributos
estéticos, mas apesar do seu porte franzino, tinha o seu cartaz como
aguerrido atleta do Esporte Clube Cruzeiro do Sul. Pois esse nosso
Amigo da Onça caiu na asneira de garantir a Nico que tiraria uma
fotografia artística sua, que ia dar uns retoques aqui e ali, nem o
próprio se reconheceria - o Marlon Brando (naquela época era o xodó
das gurias) que se cuidasse, pois logo elas iriam trocar as figuras
nas paredes de seus quartos.
E
lá se foi Nico, faceirito que nem mandalete de donzela, junto com o
Amigo da Onça para as poses no seu estúdio instalado dentro do
quarto do hotel – spot pra tudo quanto é cantinho, tinha
iluminação para tirar qualquer sombra, até mesmo de nariz
avantajado, estava caprichando naquela sessão super cansativa a que
se submetiam os mais famosos modelos do mundo.
Concluídos
os trabalhos de fotografar todos os formandos, voltou a Pelotas para
revelar os negativos e tirar as cópias dos mesmos, retornando logo
após a Jaguarão para fazer as entregas das encomendas. Encontrando
Nico junto com a turma no Café, passou-lhe às suas mãos as
respectivas fotos – decepção do dito cujo com a fidelidade ao
original – horrorosas em sua opinião, não as quis receber.
Aí,
Onça propôs a Nico resolver a pendência numa partida de snooker
– ganhasse
Nico, esse ficaria com as fotos e não precisava pagar, caso
contrário ele Onça receberia o pagamento devido. Nico meio que
regateou, mas terminou topando, já que o outro confiava demais no
próprio taco e, assim acertados, os demais da turma como
testemunhas, dirigiram-se ao Snooker do Darcy ali perto, para esse
duelo a fim de lavar a honra ultrajada.
No
cara ou coroa, coube a tacada inicial para Onça, seguindo-se depois
as encaçapadas sucessivas de Nico até a bola 7, liquidando a fatura
numa noite de Rui Chapéu.
Porém,
Onça não se convenceu que tinha diante de si um dos mais
famigerados caçadores
de marreca da
região, pedindo revanche mediante aposta do valor das fotografias.
Nico meio que sorriu disfarçadamente (eu não quero te massacrar,
cara!) e fechou na hora a parada. Desta vez, no entanto, resolveu dar
linha a Onça, deixando que ele fizesse as primeiras encaçapadas e
esperando a vez da investida fatal e de propósito demorou um pouco
para concretizar.
A
essa altura, Onça já tinha entregado as fotografias e pago para que
Nico as recebesse, tampouco tinha se dado conta da sua conduta de
marrecão
assumido,
vamos para a negra, dou-lhe doble, insistiu, insistiu e lá se foi
para o matadouro inocentemente, nem preciso contar o desfecho da
história – o coitado não conseguiu recuperar de jeito nenhum a
justa remuneração do seu labor.
José
Alberto de Souza
Publicado na Coluna Gente Fronteiriça do Jornal Fronteira Meridional em 19/03/2014
Publicado na Coluna Gente Fronteiriça do Jornal Fronteira Meridional em 19/03/2014
Cronica retirada do Livro Digital O VELHO “CHATEAU” DAQUELES RAPAZES DE ANTIGAMENTE
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