É um pessoal que se acha sem ideologia, pois,
para o lacerdinha autêntico, ideologia é coisa de esquerdista
comedor de criancinha. A direita Miami acredita que todo esquerdista
é comunista de carteirinha e que sonha com uma sociedade no modelo
da Coreia da Norte.
O ideal da direita Miami é comer hambúrguer
na Flórida, visitar a Disney todos os anos, ler a Veja, ver BBB,
copiar e colar artigos de colunistas que falam todo dia da ameaça
vermelha – e não é o Internacional nem o América do Rio -,
esbaldar-se em shoppings sem rolezinhos, salvo de patricinhas e
mauricinhos, e denunciar programas governamentais, exceto de isenções
de impostos para ricos, como esmolas perigosas e inúteis.
A
direita Miami tem uma maneira curiosa de raciocinar.
– Se você
é esquerdista, por que vai à Europa?
– Não entendi a relação
– balbucia o ingênuo.
– Se você é esquerdista, por que tem
plano de saúde?
A direita Miami contabiliza as mortes produzidas
pelo comunismo, no que tem razão, mas jamais pensa nas mortes
produzidas pelo capitalismo no passado e no presente. Mortes por
fome, falta de condições sanitárias e doenças evitáveis não
impressionam os lacerdinhas. Não parece possível à direita Miami
que se possa recusar o comunismo e o capitalismo brasileiro. A
social-democracia escandinava, por exemplo, não chama atenção dos
sacoleiros de Miami. É uma turma que quer muito Estado para si e
pouco para os outros. De preferência, muito Estado para impedir
greves, estimular isenções fiscais para grandes empresas e reprimir
movimentos sociais.
O mais curioso na direita Miami é que, embora
defenda o Estado mínimo na economia, salvo se for a seu favor, gosta
de Estado robusto em questões morais como consumo de drogas e de
sexualidade, aquelas que, mesmo criticando, costuma praticar e exigir
tratamento diferenciado quando o Estado flagra algum dos dela em
conflito com a lei. A direita Miami fala ao celular, dirigindo, sobre
a sensação de impunidade no Brasil e, se multada, denuncia
imediatamente a indústria da multa.
A direita Miami é contra
cotas, Bolsa-Família, ProUni e todos esses programas que chama de
assistencialistas e eleitoreiros. Vive de olho no impostômetro e,
para não colaborar com a excessiva arrecadação dos governos, faz o
que pode para sonegar o que deve ao fisco. Roubar do Estado que gasta
mal parece-lhe um dever moral superior.
Um imperativo
categórico.
A direita Miami vive denunciando Che Guevara, mas
nunca fala de Pinochet. Se dá uma melhorada na economia dos
camarotes, pode torturar e matar. As vítimas são esquerdistas
mesmo. A direita Miami adora metrô em Paris, quando vai até lá,
apesar de achar que tem muito museu chato e pouco shopping bacana,
mas é contra estação de metrô no seu bairro. Tem medo que atraia
“marginais”. A última moda da direita Miami é o sertanejo
universitário. Quanto mais a tecnologia evolui, mais a direita Miami
se torna primária. O que lhe falta, resolve com silicone.
Juremir Machado da Silva
Publicado na Coluna Gente Fronteiriça do Jornal Fronteira Meridional em 29/01/2014
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