Golpe de estado no Paraguai patrocinado pelos EUA teve a resposta merecida. Tiro saiu pela culatra |
“A ferida mais grave
que o Mercosul recebeu em sua história
é o golpe de Estado
parlamentar sumaríssimo que não deu o
mínimo tempo sequer para que
fossem praticadas
qualquer defesa, qualquer investigação”(...)
“Nem
a um ladrão de galinhas se processa desta maneira tão sumária”
(...)
Declarações
do presidente uruguaio José Mujica no programa radiofônico que
apresenta pela Rádio M24.
Em 22 de junho, travestido de falsa
legalidade, o golpe de estado, manejado pelo cavernícola senado
paraguaio, destituiu o Presidente Fernando Lugo. Como se monta um
golpe contra um presidente, um governador ou um prefeito que tenha
sido sufragado de maneira legítima em nossas frágeis democracias
latino-americanas? Bueno, já não se usa mais generais de plantão
como outrora. Segunda observação: se o chefe do executivo não
representa nenhum perigo aos interesses da classe dominante, não há
por que tirá-lo de lá. Mas, se, ele, por ter sido eleito pelo povo,
interrompe a série de mandatários de confiança dos conservadores e
põe em risco a cadeia histórica de benefícios já consolidada,
então não há remédio ele tem que ser afastado – até por que
ele pode se reeleger. Lugo brecou um ciclo ininterrupto de seis
décadas de mandonismo político do conservador Partido Colorado –
que ao longo deste período, inclusive, agasalhou a ditadura de
Stroessner.
Identificada
a ameaça, passa-se ao terceiro lance, à urdidura do golpe – Lugo
sofreu 23 tentativas de golpe desde o início de seu mandato. Para
tanto, como já se disse, não é mais a via militar que funciona. É
preciso mascarar a destituição com as tintas da institucionalidade.
O cenário foi uma propriedade de um antigo dirigente máximo do
Partido Colorado. Uma desocupação de terra onde perderam a vida 11
camponeses sem-terra e 6 policiais; da mesma forma que na Venezuela
em 2002, ali estavam presentes franco-atiradores. Agora era preciso
ligar tudo isso ao então presidente. E o senado paraguaio, mediante
um libelo acusatório esdrúxulo, o depôs em 24 horas.
Em decorrência, os
demais componentes do Mercosul – Brasil, Uruguai e Argentina –
reunidos em conferência, primeiramente descartaram a alternativa do
embargo econômico, por entenderem que isto somente agravaria a
situação de sofrimento do povo paraguaio, e adotaram, por consenso,
duas deliberações: (1) suspenderam os direitos do Paraguai de
participar do Mercosul e (2) admitiram o ingresso da Venezuela como
membro deste mercado comum.
E
foi o que bastou para que a maior parte da imprensa atacasse os três
mandatários e que atribuíssem interpretações estapafúrdias às
palavras do Sr. Mujica. Quando o presidente uruguaio torna públicas
as justificativas para as deliberações da conferência, as faz
constatando que uma situação de fato, uma situação política,
portanto, sobrepunha-se às questões de ordem jurídica. Isso causou
frenesi. No entanto a fala de Mujica explicitamente mencionava e
esclarecia que: “Este fato (o fato do golpe) obrigou a que fosse
aplicada a cláusula de fé democrática, a chamada Ushuaia 1, que
oportunamente tinha sido aprovada por todo o Mercosul. E merece
atenção como esta cláusula é esquecida, esta definição de
caráter jurídico”. O Protocolo de Ushuaia, é um acordo
internacional assinado pelos membros do Mercosul, mais Chile e
Bolívia, em 24 de julho de 1998, que afirma o compromisso dos
signatários com a democracia. Em seu Art. 1º estabelece: A plena
vigência das instituições democráticas é condição essencial
para o desenvolvimento dos processos de integração entre os Estados
Partes do presente Protocolo. E no artigo 5 comina sanções
compreendem desde a suspensão do direito de participar nos
diferentes órgãos dos respectivos processos de integração até a
suspensão dos direitos e obrigacões resultantes destes processos.
Eis,
portanto, que o Protocolo de Usuhaia, firmado até mesmo pelo
Paraguai, é um instrumento do Direito Internacional que estabelece a
prioridade do político sobre o jurídico.
Sérgio Batista Christino
Texto publicado na Coluna Gente Fronteiriça do Jornal Fronteira Meridional em 18/07/2012
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