Amado , o melhor
Jorge
Amado faria 100 anos hoje. É o melhor escritor brasileiro de todos
os tempos. Os críticos literários metidos a intelectuais já
gastaram muita tinta para diminuí-lo. Inventaram que ser contador de
histórias é ruim. Grande escritor seria aquele que reinventa a
linguagem. Um Joyce, que ninguém lê, um Guimarães Rosa, cujas cem
primeiras páginas derrubam qualquer um. Outros o detonaram por seu
militantismo. É a crítica engajada contra o engajamento. Jorge
Amado, afora Paulo Coelho, é o único escritor brasileiro realmente
conhecido no mundo. Machado de Assis ainda precisa de aval de
intelectuais bacanas como Susan Sontag e Harold Bloom para existir no
exterior. Todos os outros, mesmo os que mais amamos, inexistem fora
do Brasil, salvo nas notas de rodapé de algum especialista. Nem
Drummond, nem Clarice, nem Cabral. O mundo dos mortais só conhece e
admira Amado.
Faz sentido. Ele criou personagens, mundos,
vidas reais, gente falando linguagem de gente. Só Capitu tem tanta
vida quanto um personagem de Amado. E, mesmo assim, perde para a
exuberância de Gabriela. Volta e meia, alguém diz que Machado de
Assis tem sido atrapalhado pelos limites da língua portuguesa. É
balela. Verdade pela metade. A difusão universal da obra Jorge Amado
prova que línguas não barram o que encanta as pessoas. A literatura
russa está aí para não me deixar mentir. Amado foi um gênio, um
craque, um monstro da história popular, da narrativa empolgante,
envolvente, completa, com ternura, humor, magia, violência, cor
local, sentimentos universais, aspirações transcendentais,
sincretismo e tudo mais. Machado de Assis foi Pelé. Jorge Amado foi
nosso Garrincha. Em certo sentido, Garrincha foi melhor. Um virtuose
no seu gênero, na sua especificidade, o que pode colocá-lo acima de
Pelé. O Rei do Futebol tem números que deixam tonto. Amado
Garrincha cometeu um erro: ser muito popular. Popular como futebol de
rua.
Crítico literário, essa categoria em extinção, adora
obra chata. Jorge Amado foi incapaz de ser chato. Tem crítico que só
admira um texto se tiver neologismos e afetação. Amado passou longe
de qualquer afetação. Era autêntico, espontâneo, vital. Não caiu
nas complicações linguageiras de Guimarães Rosa nem na secura de
Graciliano Ramos. Foi deliciosamente barroco. Nada a ver com a
superficialidade vagabunda de Paulo Coelho. Nem com o umbilicalismo
dos autores de agora. Ah, se Cristóvão Tezza, que anda julgando o
que teremos de bom no futuro, tivesse escrito uma só página de
ficção capaz de atar o cadarço do sapato de Jorge Amado! O Brasil
não tem Amado atualmente. Não tem um escritor capaz de emocionar o
mundo pela profundidade da sua arte abundante e rica.
A
mediocridade impera. Há bons escritores. Nenhum com o porte de
Amado. Só se conta historinha. Que saudades de Jorge Amado e do seu
tempo. Andei relando Jorge Amado. Pensei em largar tudo só para ter
tempo de me exilar dentro dos seus livros. Amado, mil vezes Amado,
esse Jorge que mata o dragão com estilo.
Juremir Machado da Silva
juremir@correiodopovo.com.br
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