Dia
desses ouvi falar do filme/documentário sobre Raul Seixas, “O início o fim e o meio”.
Ainda não chegou por aqui. Por isso ainda não assisti. Mas, por
tudo que li, é muito bom. Imperdível, eu diria.
Depois,
outro dia, lembrei de uma entrevista do Raul para o Kid Vinyl. E essa
sim, eu ouvi. Nela, Raul Seixas dizia: “tenho
certeza de que não vou morrer”.E
por isso resolvi escrever...Um dia a terra parou e Raul fingiu que
não viu e seguiu. O tempo passou e Raul ficou. Vinte anos atrás,
ele deu adeus, embarcou num disco voador e voou.
Raul
sempre leu muito. Começou explorando os livros da biblioteca de seu
pai, onde ficava horas viajando por galáxias e estrelas distantes,
nos livros de astronomia. Depois de sair de Salvador e passar fome na
cidade maravilhosa, Raul resolveu fazer terapia e cursar filosofia.
Só mais tarde é que foi viver de cantoria.
Enquanto
viveu, Raul se recusou, terminantemente, a aceitar o determinismo
nesta vida: “Eu
que não me sento/No trono de um apartamento/Com a boca
escancarada/Cheia de dentes/Esperando a morte chegar...”
Para
ele, o hoje era apenas um furo no futuro, por onde o passado começava
a jorrar. Viveu como quis. Morreu quando cansou deste lugar onde
jamais conseguiu se encontrar.
Dez mil anos atrás, Raul havia começado a sonhar em ser cantor e compositor. Mas para ele – poeta - a passagem do tempo parece não importar tanto assim. Se tempo presente ou futuro para ele tanto faz quanto fez. E assim ele se fez.
Tempos
depois ele declarava: “Eu
sou tão bom ator que me finjo de poeta e profeta e todo mundo
acredita.”
“Se
hoje eu sou estrela, amanhã já se apagou/Se hoje eu te odeio,
amanhã lhe tenho amor.”
Era chato chegar a um objetivo num instante. Ele se transmutava a
todo instante. E o ritmo que isso acontecia era tão alucinante, era
tão estonteante, que Raul se tornou uma metamorfose ambulante.
Mas com o passar do tempo ficou difícil ordenar o pensamento. Seu tempo era ao mesmo tempo perto e distante. Neste instante o álcool entra em sua vida. Uma anestesia para a monotonia do dia-a-dia.
No
final já estava cansado de viver drogado. Mas já estava
escravizado. Quando quis dizer não, o álcool e a droga já o haviam
jogado ao chão. Então disse:: “Eu
não morri de overdose; eu morri foi de tédio” O diretor do
documentário “O início, o fim e o meio”, Walter
Carvalho, disse que Raul morreu de amor.
“Do
passado me esqueci / No presente me perdi / Se chamarem diga que eu
saí.”
Um dia Raul disse: “para
o futuro não estou nem aí.”
O Maluco vivia a esmo. Fugia de si mesmo. Não que fosse um frustrado
ou fracassado, apenas tinha um universo inteiro a rodar em seu
costado.
Outro
dia disse: “O
universo me espanta e não posso imaginar que esse relógio exista e
não tenha relojoeiro”.Raul
nunca conseguiu ficar sozinho. Ao mesmo tempo, nunca conseguiu ficar
com ninguém por muito tempo: “Como
marido, sou uma merda total. Como compositor e cantor, sou o homem
ideal.”
Um
turbilhão de ideias. O copo sempre à mão. Uma profusão de imagens
e possivelmente uma confusão na mente. Mas antes do álcool lhe
embotar totalmente, sua genialidade se fez presente. Raul deixou sua
semente. “Eu
não sou louco, é o mundo que não entende minha lucidez”.
Lúcido
o bastante para não entrar em toda e qualquer luta. Com onze anos de
idade já desconfiava da verdade absoluta: “Tem
gente que passa a vida inteira / Travando a inútil luta com os
galhos / Sem saber que é lá no tronco /Que está o coringa do
baralho.”
Tal
qual um fora-da-lei, Raul viveu de lutar contra o rei. Mas o mundo é
um moinho e Raul morreu sozinho. E assim é a vida, o caminho do
acaso é o azar ou a sorte. E o caminho da vida, seja no início no
fim ou no meio, é a morte.
Antes
da morte, Raul nos deixa um mote: “Jogue
as cartas, leia a minha sorte / Tanto faz a vida como a morte / O
pior de tudo eu já passei.”
Mas
Raul não morreu. E isso sabia ele e sei eu.
Enilton
Grill
Texto publicado na Coluna Gente Fronteiriça do Jornal Fronteira Meridional do dia 30/05/2012
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