Publicamos da Coluna do Juremir Machado no Correio do Povo do dia 27/07/2011
Crédito: ARTE PEDRO LOBO SCALETSKY |
A revista francesa Les Inrockuptibles lançou um manifesto de repúdio a Harry Potter, o eleito sem mérito, cujos "poderes" são inatos ou concedidos por seus protetores, o bonzinho insuportável, o bom menino que não faz artes. Especialmente não faz arte, "inodoro, incolor e sem sabor, garoto intelectualmente banal num universo extraordinário". Um medíocre com bom comportamento. Assino embaixo. Amy era mau exemplo? Pode ser. Não soube viver mais. Naufragou no álcool e nas drogas. Perdeu o controle do seu lado maldito. Harry Potter é bom exemplo? Não. Era o bem transformado em lição permanente de moral. Estou de luto pela morte de Amy Winehouse. Em contrapartida, espero que Harry Potter não volte para atormentar nossas crianças e nossos adolescentes com seu mundo mágico barato. Chega de bruxos, de vampiros e de malas.
Tem muito psicanalista tecendo loas a Harry Potter. Conversa fiada. A única bruxinha interessante era Amy. Morrer cedo é sempre um bom caminho para a sobrevivência. Che Guevara virou mito. Não pagou o mico de ser visto, como Fidel Castro, com um abrigo horrível da Adidas. Humor sombrio à parte, não estamos mais nos anos 1960, como qualquer um já deve ter percebido, se bem que alguns são lentos, e não cabe elogiar a loucura, a morte precoce ou a abertura das "portas da percepção", ou do outro lado, pelo consumo de drogas. Há algo, porém, de inquietante e provocativo nessa sede de viver e nessa incapacidade de aquietar-se. Dizem que Amy não soube lidar com a fama. Besteira. A fama não lhe bastava. Ela não soube encontrar satisfação apenas na fama, que parece bastar aos medíocres. Amy foi o oposto de Harry Potter.
Terrível é saber que ela não voltará. Já Harry Potter sempre poderá ressurgir. Que medo! Amy provou que não há reabilitação para o excesso de talento e para a inconformidade com o trivial do cotidiano. O que ela queria? Não sei. Certamente prazer, felicidade, amor, satisfação e todas essas coisas que para alguns não se resumem a ser famoso ou a poder voltar para casa cheio de sacolas com produtos de grife. Na maldição de Amy havia alguma coisa a ser aproveitada. Xô, Harry Potter. Vai.
Juremir Machado da Silva | juremir@correiodopovo.com.br
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