Normalmente
vem a primeira frase e dela nasce o resto todo. Mas dessa vez tudo
parece turvo demais para uma primeira frase que não esta,
explicativa, fria, mordaz. Ocorreu-me que quando alguém vai embora,
parte para um outro país que existe longe da gente, perdemos não só
os momentos que ainda poderíamos compartilhar, perdemos um pedaço
de nós mesmos que só existia quando aquela pessoa estava por perto.
Não
falo de um amigo, falo de alguém que poderia ter sido mas jamais
será, por que o destino em seu viés mais estúpido e mesquinho
vestiu-se de vilão e me privou de um pedaço de mim que eu sequer
cheguei a conhecer direito.
Esta
é uma carta de despedido para alguém que quase não conheci, alguém
com quem quase não sorri, alguém com quem quase não partilhei
sonhos, angustias, agruras e posicionamentos políticos.
É
uma carta para um amigo que não tive, mas que mexeu com tanta gente
de quem gosto que me sinto na obrigação de escrevê-lo, de colá-lo
no papel, imprimi-lo, quiçá naquele pedaço de mim que seria dele,
caso tivéssemos dividido outros copos e outras noites, naquele que
sabe apenas ser inventado por sorrisos sinceros, por passos de dança
desconcertados, por canções que não se cantam quando se está
sóbrio.
É
uma carta para aquele pedaço de cada um de nós, que se parte quando
parte alguém que não deveria tê-lo feito, é um grito desesperado
de quem só tem o papel como aliado, é a voz que ainda tenho nesses
dias de ser mudo. É a lágrima da moça de há tempo beijando o chão
frio dos teus passos não pisados.
É
uma carta, meu velho, meio torta, uma despedida meio errada, mas é
tudo o que eu tenho a oferecer, já que aquele pedaço de mim, agora,
jamais vai poder ser teu.
Nicolás Balado Gonçalves
Texto publicado na Coluna Gente Fronteiriça do Jornal Fronteira Meridional em 18/02/2012.
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