terça-feira, 3 de abril de 2012

Lembranças do CEES . Há quarenta anos, no Segundo Ano do Curso Científico.


    
   Em 1972, no Segundo Ano do Curso Científico, aglutinaram-se os alunos provenientes das turmas “A” e “B” do Primeiro Ano de 1971, vários repetentes e alguns transferidos doutras escolas. Com cerca de quarenta educandos, ficamos numa ampla sala do pavilhão dos fundos do então C.E.E.S. e originou-se uma compreensível azáfama.

O Carnaval terminara pouco antes e, naquele calorento março inicial, os estudantes foliões rememoravam os recentes folguedos carnavalescos. Folião nunca fui e estando isento daquelas rememorações, sentei-me silencioso na primeira coluna da direita e era o terceiro rente à parede da porta. À frente, sentaram-se o Saul Oliveira e o Luís Fernando Passos. À retaguarda, o Jorge Eduardo Fonseca, um rapaz recém-chegado de Pelotas, de baixa estatura. Depois, na sequência, dois “Nelsons”, o Eliseu e o Bittencourt. Ao meu lado esquerdo, sentou-se o Júlio César Meroni e de outros pouco mais me ajuda a velhusca memória. Mas me lembro, e muito bem, da turma do barulho, concentrada ao fundo, do lado esquerdo da sala, nas proximidades da janela, ponteada pelo tonitruante Juarez, natural de São Lourenço, se não me engano, mais o Carlos/Carlinhos Silveira, o Dídio Bezerra, o Jairo Fonseca entre outros. No meio deles, algumas colegas estudiosas e quietas, as quais nunca entendi de que maneira foram ali parar. Dessas, lembro-me da Vera/Verinha, da Neiva Cristina e da Leocádia. Dos meus companheiros de fileira, desde então, revi apenas o Luís Fernando e o Nelson Eliseu, os restantes nem imagino como andarão, se andarem.

   A nossa primeira aula do ano foi de Matemática e todos os alunos presentes podem, ou devem, tê-la esquecido, menos um: eu. A razão é simples: nela ganhei um ponto extra para a primeira nota. A Professora Rosa Isolina Nizoli Aguilar concluiu a chamada nominal e após rápida explicação sobre a matéria a se aprender – Derivadas e Integrais – perguntou qual era a Equação Fundamental da Trigonometria, estudada noutro março, o do ano anterior, que seria de utilidade para o assunto referido. Por um capricho da sorte, lembrava-me e quieto fiquei, esperando a iniciativa alheia, porque não queria passar por sabichão. O alvoroço serenou por momentos, enquanto a professara caminhava lentamente até o fundo da sala, detendo-se próxima da “turma do barulho”; encostou-se à parede e repetiu a pergunta. Nova pausa nos cochichos localizados, momescos ou não, todavia o silêncio fez-se breve, enquanto ela retornava para frente da turma. Ali, virou-se para a classe e fez-me acionar o gatilho da ousadia, vencendo a timidez natural, quando, a professora perguntando pela terceira vez, propôs adicionar um ponto à primeira prova para quem respondesse; só então respondi. O falecido Dídio, de espírito vivaz e brincalhão, pilheriava com todo o mundo, logo me chamou de “éungênio”.
Engano seu, não me chamo Eugênio!

   A Professora Rosa Isolina interagia com extrema fidalguia, jamais usava palavras rudes para admoestar quem quer que fosse, exibindo um enorme coração. Além disso, explicava fácil e com cativante simplicidade a minha matéria favorita de sempre. Ao contrário do Português, meu eterno algoz, constantemente, mirando-me com excessiva gula e querendo me puxar para a sua guilhotina. Aqui me permito uma singela divagação. No primeiro Ano fui a exame final em uma só matéria, por meio ponto, mas fui. Curiosamente, era ministrada por uma das minhas professoras favoritas, e por quem nutria imenso desvelo: a Professora Maria Ceci Bretanha de Moraes. Ao rever as provas anteriores para me preparar para a derradeira, resolvi somar os pontos da primeira do ano, uma longa de quatro folhas, dividida e subdividida em itens e sub-itens. Surpreendi-me ao verificar que a nota deveria ter sido 8,5 e não a de 7,5 assinalada, o que me livraria daquele solitário exame. Como 7,5 em Português equivalia, na minha óptica transversa, a um dez em Matemática, nem sequer me dei o trabalho de conferi-la à época aprazada. Levei aquela prova para o exame final e, ao seu término, mostrei-a a Professora Maria Ceci, que lastimou o ocorrido. Esse fato a ela terá sido esquecido, a mim, sempre será lembrado. Assim foi: da matéria que mais gostava, somou-se ponto, da que menos, subtraiu-se; ambos graciosos.

  A essas duas jovens Mestras do nosso tempo, o meu carinho, entremeado por quarenta anos de saudade, uma eterna reverência e que a vida lhes seja benfazeja, estejam em que lugar estiverem.

   Daquela heterogênea turma, do Segundo Científico/1972, guardei excelentes lembranças e a recordação pouco amistosa duma professora que decidiu realizar suas provas valendo nove pontos, sendo o décimo rematado por conceito pessoal. Durante o ano letivo foram seis provas e o correspondente número de pontos creditados conforme o seu soberano juízo. Por motivos que me escapam à rasa compreensão, os meus seis pontos de “conceito” foram passear pelos anéis de Saturno.

  Sobretudo dos colegas, ficou uma sadia camaradagem que a sucessão dos anos não consegue apagar, embora nunca mais tenha encontrado a maioria deles e, vagarosamente, as recordações esmaeçam-se nos claudicantes neurônios. É uma pena, porém daqueles dias nem ao menos fotos guardamos. Eram caras, o bolso vazio, apenas os profissionais possuíam máquinas fotográficas, salvo raras exceções, essas, não eram da nossa turma. Poderiam ter criado esses onipresentes celulares/câmeras àquela época e teríamos a jovem imagem até hoje, mas não. Restam-nos fragmentos de lembranças que se apagarão a qualquer hora, quando nos chegar o momento extremo para rumarmos à dimensão ignorada, na única viagem inevitável. Enquanto a abençoada escuridão da noite não pretejar em definitivo as minhas reminiscências, quero ter o prazer de me reunir com os colegas do extinto Curso Científico, marcando presença no próximo encontro, se houver.

   Talvez, noutro capricho da sorte, reencontre algum antigo parceiro daquele Segundo Ano, o de 1972, e esse reanime as minhas recordações minguantes, adicione as que me escaparam ou se dissolveram na longa esteira do tempo. Aí, refrescando o espírito, ser-me-á melhor escutar em silêncio, as distintas versões sobre aquele simbólico ano e bem sorver os ecos duma época admirável, da qual tivemos o privilégio de compartilhar.

   Quem sabe, não encontre alguma historieta perdida, merecendo ser relembrada?!
   Esperemos...
Lino Cardoso

Texto publicado no Jornal Fronteira Meridional, edição do dia 28/3/2012

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